Os terrenos de marinha e seus acrescidos consistem numa faixa de terra de 33 metros, medidos horizontalmente em direção ao continente, tomando por base a Linha do Preamar-médio (LPM), de 1831, segundo o Decreto-Lei nº 9.760, de 05 de setembro de 1946.
Como informação, são considerados acrescidos os terrenos formados natural ou artificialmente em direção do oceano, dos rios e das lagoas, em seguimento ao terreno de marinha.
O domínio da União sobre a costa marítima é estratégico para garantir o desenvolvimento econômico, social e ambiental do país. Na faixa costeira estão localizados ecossistemas de alta relevância ambiental (manguezal, restinga, apicum, por exemplo), essenciais para a subsistência das comunidades locais e fundamentais para a prevenção de riscos de degradação e medidas de adaptação às mudanças climáticas.
Merece salientar as atividades como os portos públicos e privados, usinas eólicas, extração de petróleo e gás, pesca industrial e artesanal, infraestruturas estratégicas como cabeamento de internet, rede elétrica, empreendimentos imobiliários e complexos turísticos, desenvolvidos no litoral.
Desse modo, a gestão dos terrenos de marinha pela União é essencial para a soberania nacional. O domínio do Governo Federal garante a proteção estratégica desse conjunto de áreas que são essenciais para a defesa e para o desenvolvimento econômico no Brasil. O mar brasileiro contribuiu com 4,6% para o PIB nacional, em 2022.
O parágrafo 4º, artigo 225, Constituição Federal, diz: ”A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais”. Significa a obrigação do Poder Público e da comunidade em preservá-la e utilizá-la de forma sustentável.
Enfim, a proteção da costa brasileira é responsabilidade de vários órgãos e instituições, tanto governamentais como civis. Entre os órgãos e instituições governamentais compete ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marinha do Brasil, Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Ibama, Agência Nacional de Transportes.
A erosão costeira no Brasil, passou a ser observada como motivo de preocupação por ser um risco crescente da ação do mar em direção ao continente, ou seja, terrenos de marinha, margens de ilhas, rios, lagoas sob influência das marés, por causas naturais ou antrópicas, a partir dos anos 70 e ganhou grande impulso nos anos 90.
Com a proclamação da Lei nº 7.661 de 18 de maio de 1981, com alterações introduzidas pela Lei nº 14.714, de 30 de outubro de 2023, foi instituído o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC), como parte integrante da Política Nacional para os Recursos do Mar (PNRM) e Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), regulamentada Decreto nº 5.300 de 7 de dezembro de 2004.
Os Estados e Municípios, através de lei, proclamaram, os respectivos Planos Estaduais ou Municipais de Gerenciamento Costeiro, observadas as normas e diretrizes do Plano Nacional e o disposto nesta lei, e designar os órgãos competentes para a execução desses Planos, conforme o § 1º, artigo, Lei nº 7.661.
Os problemas ambientais no litoral mundial foi objeto de destaque na reunião da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente realizada em 1992, no Rio de Janeiro, com a publicação do documento com diretrizes e metas, objetivando promover o desenvolvimento sustentável do planeta Terra no século XXI, a Agenda 21, exigindo-se o comprometimento dos estados litorâneos no gerenciamento sustentável e integrado da costa
Apesar das decisões estabelecidas na Agenda 21 exigindo dos estados litorâneos o gerenciamento costeiro integrado e sustentável e o estabelecimento de legislação específica, inclusive os municípios, muito pouco ou quase nada tem-se conseguido na proteção da costa brasileira, especificamente na proteção dos terrenos de marinha.
Dados de 2018, publicados no Panorama da Erosão Costeira no Brasil, cerca de 60% das praias brasileiras estão sob o impacto da erosão e acúmulo de sedimentos, sendo que o Norte e Nordeste apresentam 60% e 65%, respetivamente.
No Ceará apenas 2 dos 20% dos municípios litorâneos estão livres de ainda sofreram o efeito do processo erosivo. O litoral cearense com cerca de 47,5% sob processo erosivo (Diário). Quase 70 km do litoral de sergipano apresenta erosão moderada ou intensa, destacado o processo erosivo na Praia do Saco com a destruição de imóveis residencial, comercial, consequente do avanço de 130 metros do Rio Piauí sobre as margens, no período de 10 anos.
No litoral baiano merece destaque o processo erosivo das praias de Ilhéus, em consequência da construção do porto de Malhado e outras atividades antrópicas com alterações significativas na configuração da orla. Outro exemplo digno de nota, trata-se do processo erosivo no litoral camaçariense, especialmente na praia de Guarajuba, distrito de Monte Gordo.
A situação não é diferente nos demais estados litorâneos, a exemplo do litoral sul de São Mateus (ES), litoral fluminense, baixada santista, litoral gaúcho entre outros.
Os terrenos de marinha no litoral brasileiro estão sob processo erosivo crescente, como consequência a configuração atual da orla nacional é bastante diferente da configuração à época da instituição da linha do preamar-médio de 1831, havendo necessidade urgente de reavaliação desse parâmetro.
Atualmente, considerar terrenos de marinha como uma faixa de 33 metros, medidos horizontalmente para o continente, a partir da linha do preamar-médio de 1831, com avanço do mar, a União corre risco de cobrança das taxas como laudêmio, foro e outras, sobre os terrenos alodiais, aqueles considerados terrenos fronteiriços aos terrenos de marinha, livres de ônus, vínculos, foros etc.
Enfim, a faixa de 33 metros estabelecida em 1831, considerada terrenos de marinha não se aplica atualmente, considerando a mudança de configuração litorânea provocada pelo processo erosivo em virtude do aumento gradual do nível médio dos oceanos, consequente das mudanças climáticas, segundo estudos científicos realizados no mundo inteiro.
A propósito, está em tramitação na Comissão de Constituição Justiça e Cidadania, a Proposta de Emenda à Constituição - PEC 3/2222, visando a transferência de propriedade de parte dos terrenos de marinha e seus acrescidos da União para os Estados, Municípios, foreiros e ocupantes, conformes critérios específicos e eliminação da cobrança de laudêmio, foro e taxa de ocupação.
O debate da PEC 3/2222 iniciou com uma audiência pública no Senado, quando a Secretaria de Patrimônio da União do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (SPU) se posicionou contra a proposta, considerando, entre outros argumentos, o domínio da União da costa brasileira é estratégico para garantir os objetivos de desenvolvimento econômico, social e ambiental do país.
Qualquer que seja a decisão sobre a PEC 3, o Parlamento e/ou União deverá propor um instrumento legal, para reavaliar a linha do preamar-médio de 1831, por se tratar de parâmetro irreal para definir a configuração atual da costa brasileira, fortemente degradada pela ação erosiva do oceano. Salvo melhor interpretação!
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